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ENTREVISTA EXCLUSIVA

Juventude exige protagonismo na Agenda Global: representante das Nações Unidas defende renovação de acordos multilaterais

O secretário-geral assistente para Assuntos de Juventude da Organização das Nações Unidas Felipe Paullier destacou, em entrevista exclusiva para o G20 Brasil, a urgência de integrar a juventude nos processos decisórios globais, alinhando as agendas da ONU e do G20 para enfrentar os desafios do século 21, como concretizar o desenvolvimento sustentável.

05/09/2024 07:00 - Modificado há 7 meses
O sub-secretário adjunto das Nações Unidas para a Juventude, Felipe Paullier, durante a entrevista ao G20. Crédito: Audiovisual G20
O sub-secretário adjunto das Nações Unidas para a Juventude, Felipe Paullier, durante a entrevista ao G20. Crédito: Audiovisual G20

Em um momento em que o mundo enfrenta crises interligadas, que vão da mudança climática à desigualdade social, a maior geração de jovens da história (com quase 2 bilhões de pessoas atualmente) exige participar das decisões que vão moldar o futuro e surge como força vital para a transformação global. O uruguaio Felipe Paullier, secretário-geral assistente para Assuntos de Juventude da ONU, conversou com a equipe de comunicação do G20, onde defendeu o envolvimento dos jovens como fundamental para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e moldar um planeta mais equitativo e sustentável. Nesta entrevista, Paullier fala sobre como as agendas da ONU e do G20 convergem em torno das necessidades e demandas dos jovens, destacando a importância de integrá-los de forma significativa nos processos decisórios em todos os níveis.

Como a agenda de juventude das Nações Unidas se alinha com a agenda do G20?

Elas estão extremamente alinhadas. É simbólico que a reunião do G20 deste ano aconteça no Rio de Janeiro. É uma cidade muito típica para a agenda de desenvolvimento sustentável. O desenvolvimento sustentável, tal como o conhecemos, tem um longo caminho que pode ser identificado como começando em 1992, nesta mesma cidade, e 20 anos depois, na reunião do Rio+20. Portanto, definitivamente o G20 é um espaço muito importante na agenda global. 

Os compromissos que estão sendo assumidos em termos de desenvolvimento sustentável estão alinhados com o que a Organização das Nações Unidas (ONU) pode fazer. A ONU é a plataforma multilateral que reúne o mundo todo, são 193 países, isso é relevante porque há um forte alinhamento com os compromissos com os governos que representam 80% da economia global estão assumindo em termos de sustentabilidade, e especificamente neste Y20, quando se trata de engajamento e participação dos jovens.

Considerando a juventude de uma perspectiva plural, como juventudes, em termos de diferenças de classe, raça, gênero e nacionalidade, existe uma demanda comum que unifica todos esses jovens no mundo atual? 

Isso cria uma agenda muito diversa, se eu tiver que falar especificamente sobre questões de juventude, podemos dizer que há 1,9 bilhão de prioridades que cada uma dessas vozes traz para a mesa. Eu acho que há uma demanda comum que é sobre um engajamento melhor e mais significativo quando se trata de tomada de decisão.

Há um grande desequilíbrio entre demografia e processos de tomada de decisão. Podemos pegar, por exemplo, um fato sobre a participação de jovens nos parlamentos. Apenas 2,8% dos membros dos parlamentos ao redor do mundo têm menos de 30 anos. Há um grande desequilíbrio nas dinâmicas de poder. Posso dizer que em todos os países que visito, há uma disposição comum dos jovens em contribuir e não apenas em espaços paralelos. É sobre como integrar essa vontade de participação com as tomadas concretas  de decisão. 

Há um grande desequilíbrio entre demografia e processos de tomada de decisão. Podemos pegar, por exemplo, um fato sobre a participação de jovens nos parlamentos. Apenas 2,8% dos membros dos parlamentos ao redor do mundo têm menos de 30 anos. Há um grande desequilíbrio nas dinâmicas de poder.

Acho que é crucial que as conclusões que cada uma das delegações de jovens de todos os países do G20, encontrando pontos de acordo e pontos comuns, estejam relacionadas com os compromissos finais que os chefes de Estado tomarão no espaço do G20. As Nações Unidas fará um movimento muito importante, que será a Cúpula do Futuro no final de setembro em Nova Iorque,  que reunirá todos os chefes de estado dos 193 governos que fazem parte da ONU para repensar e reformar o multilateralismo.

Como os jovens podem participar das mesas de negociação econômica? 

Acredito que os desafios que enfrentamos, em termos de cada espaço institucional, são sobre o fato de termos um sistema que foi estabelecido com a lógica do século 19 ou 20, tentando resolver os desafios de uma era diferente. Nos últimos 10, 15 anos, o mundo mudou dramaticamente. As oportunidades para os jovens e para a cidadania participarem são completamente diferentes. Os sistemas de prestação de contas são diferentes, é necessário repensar como as instituições estão se engajando com a sociedade civil, com as vozes jovens, com a cidadania em geral. Acho que o estabelecimento do Escritório da Juventude das Nações Unidas, há alguns meses, pela Assembleia Geral das Nações Unidas, é um exemplo de um passo no compromisso dos governos em uma nova forma de engajamento com as vozes jovens. 

A única maneira da agenda avançar é de forma colaborativa. Por isso estamos aqui, com o Escritório de Juventude participando desta reunião do Youth20. Queremos ouvir quais são as conclusões, quais são os compromissos e os acordos que todas essas delegações de jovens estão trazendo para a mesa. Espero que essas conclusões sejam levadas pelos chefes de Estado para serem incluídas nos compromissos finais que o G20 assumirá neste ano sob a presidência do Brasil.

Acredito que os desafios que enfrentamos, em termos de cada espaço institucional, são sobre o fato de termos um sistema que foi estabelecido com a lógica do século 19 ou 20, tentando resolver os desafios de uma era diferente. Nos últimos 10, 15 anos, o mundo mudou dramaticamente. As oportunidades para os jovens e para a cidadania participarem são completamente diferentes.

Muitas políticas não atendem aos desejos dos jovens e estão fora de sintonia com o mundo atual, qual é a importância de uma reforma da governança global para as agendas de juventude?

É impossível resolver e nosso Secretário-Geral tem uma maneira muito simbólica de expressar isso. António Guterres disse que não seremos capazes de resolver os desafios dos nossos netos com um sistema que foi projetado para resolver os problemas dos nossos avós. As Nações Unidas, no próximo ano, estarão celebrando 80 anos, eu não acredito que alguém duvide da necessidade de uma governança global. Os desafios que o nosso mundo enfrenta estão completamente interconectados, a crise climática, a crise de saúde mental que adolescentes e jovens estão enfrentando em todas as partes do mundo. 

O mundo está passando por mais conflitos ativos desde a Segunda Guerra Mundial. O sistema precisa ser transformado, e este é o único espaço onde estamos reunindo todos. Acho que as vozes jovens nesse processo são cruciais porque os valores que as Nações Unidas e o multilateralismo representam estão muito conectados com os jovens. Tive a oportunidade de interagir com alguns delegados jovens de diferentes partes do Brasil e perguntei a eles o que a ONU significa para eles e acho que a resposta deles foi muito interessante. A ONU significa esperança, a ONU significa diversidade, e a ONU significa convenção. E acho que é aí que estamos. Precisamos dessas vozes jovens porque eles acreditam no multilateralismo. Alguns deles nasceram no mundo mais interconectado de todos os tempos. Esta geração atual é a mais educada e a mais global de todos os tempos. Então, mais do que nunca, precisamos dessas vozes se realmente quisermos alcançar e ter uma governança mais eficaz no multilateralismo.

Precisamos dessas vozes jovens porque eles acreditam no multilateralismo. Alguns deles nasceram no mundo mais interconectado de todos os tempos. Esta geração atual é a mais educada e a mais global de todos os tempos. Então, mais do que nunca, precisamos dessas vozes se realmente quisermos alcançar e ter uma governança mais eficaz no multilateralismo.

Um em cada cinco jovens no mundo não está estudando nem trabalhando. Que compromisso e políticas públicas os governos precisam assumir para enfrentar essa situação?

Os problemas de acesso à educação, qualificação e emprego são globais. Este desafio para a juventude se repete em todas as regiões, mas a resposta não é comum. São desafios globais que precisam ter perspectivas e compromissos regionais e nacionais. Mesmo em países como o Brasil, que é tão diverso, precisa de perspectivas subnacionais para ser eficaz. Como você mencionou, um em cada cinco jovens no mundo atualmente não está na educação, no emprego ou na formação e essa questão também tem uma perspectiva de gênero. Dois desses três jovens são mulheres. É necessário que nas respostas, nas políticas que criarmos, também tragam essa perspectiva intersetorial. A desigualdade de gênero está claramente afetando também esse tipo de questão. Não é o mesmo ser uma jovem mulher do que ser um jovem homem quando se trata de acesso à educação, formação ou emprego.

Isso é sobre compromissos globais, mas com programas nacionais e específicos em nível local. Vemos que capacitar os jovens em programas de empreendedorismo está trazendo respostas concretas e positivas. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) recomendou em seu relatório que esse é o caminho em que devemos avançar juntos. Estou feliz de ver que nesta reunião do G20 e especificamente neste Youth 20 há muitos jovens brasileiros de todas as regiões trazendo suas perspectivas também para este processo.

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