Não existe dignidade ou prosperidade, estando em situação de rua, pontua ministro dos Direitos Humanos do Brasil
Silvio Almeida, Ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania do Brasil, enfatiza que a situação de rua é sinônimo de vulnerabilidade extrema, violência constante e falta de condições básicas de vida. Em entrevista para o G20 Brasil, ele destacou que o aumento da população de rua é um fenômeno global, exacerbado pela pandemia da Covid-19, e exige uma resposta urgente dos governos.

Por Mara Karina Sousa-Silva/Site G20 Brasil
“Estar em situação de rua é estar sob todos os riscos de viver na rua, ter que dormir na rua, ter que existir nas ruas de uma grande cidade. Significa que você está exposto a violência o tempo todo”, negritou Silvio Almeida, ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania do Brasil (MDHC), em entrevista exclusiva para o G20 Brasil. Almeida esteve na abertura de evento paralelo ao fórum que discutiu a produção de dados sobre a população de rua nas maiores economias do mundo, realizado nesta semana, em Salvador.
Almeida disse que o aumento expressivo das pessoas em situação de rua não é exclusivo dos países do Sul Global ou da periferia do capitalismo, como o ministro prefere salientar, mas também das nações mais industrializadas. “Isso mostra que mesmo nos países do chamados centro do capitalismo avançado ou industrializado, você tem os arranjos políticos e econômicos que levam à pobreza e à situação de rua. Quanto mais a situação econômica, mesmo nesses países mais ricos, vai se degradando, a situação das trabalhadoras e trabalhadores também se degradam a ponto que você tem um aumento expressivo da situação de rua”.
Na avaliação do ministro, a pandemia da Covid-19 tornou o panorama ainda mais grave, exigindo que os governos aprofundem as discussões sobre a adoção de políticas que sirvam de modelo para resolver a questão que é global. Para Almeida, o desenvolvimento está no cerne da questão, uma vez que a pobreza é um empecilho para que as economias cresçam.
Estender a proteção social

Violência doméstica, drogadição, doenças mentais, desigualdades etnico-raciais; dificuldade de pagar para ter um lar. Essas são alguns dos elementos que levam as pessoas a perderem suas casas e chegarem a situação de rua. Do ponto de vista de Almeida, elementos identificados pelo filósofo camaronês Achille Mbembe para cunhar o termo necropolítica também podem ajudar a explicar o cenário.
“Sendo bastante sintético, o que ele está chamando de necropolítica é uma mudança qualitativa do modo de atuação do Estado sobre os indivíduos, que têm uma relação direta com o surgimento e ascensão do neoliberalismo. Em determinado momento da formação do estado moderno, você tem o Estado que intervém dando as condições para o fazer viver e o deixar morrer e um encurtamento de de todo o sistema de proteção social”, explicou.
De acordo com Almeida, as crises levam a disputa pelo orçamento público e a captura desses recursos para fins privados, deixando cada vez menos espaço para lidar com as mazelas produzidas pelo capitalismo como a fome, a miséria e a pobreza. Nesse cenário, ressaltou, o papel dos governos é lidar com as consequências dessas mudanças, expandindo o sistema de proteção social.
“Uma medida que não resolve o problema, mas que é fundamental, que é expandir o sistema de proteção social, o que envolve disputa política, porque a tendência do movimento é justamente o contrário: reduzir o sistema de proteção social para que haja captura do orçamento por grupos que não têm os interesses do povo trabalhador, das pessoas mais pobres. É necessário, ao mesmo tempo, fazer um debate sobre como as restrições orçamentárias são ser cada vez mais produtoras de tragédias e de desgraças”, assegurou.
Silvio usou a tragédia climática e humanitária do estado brasileiro do Rio Grande do Sul para chamar atenção para a urgência de rediscutir as capacidades do Estado, “principalmente diante dos danos que o nosso modo de viver está provocando no meio ambiente da natureza. Vamos ter que expandir a capacidade do Estado de lidar com esse tipo de evento”, cexemplificou.
Experiência brasileira
Almeida destacou que o G20 é um espaço fundamental para o diálogo e troca de experiências tanto sobre a produção de dados como de boas práticas em políticas públicas para a população de rua. “O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem uma preocupação especial com as pessoas em situação de rua, da moradia. Mas diante do crescimento exponencial que nós vivenciamos nos últimos anos das pessoas em situação de rua, o presidente considerou seria necessário uma ação mais contundente, direta, que atacasse diretamente o problema”.
O ministro fala do programa Ruas Visíveis, lançado em abril, que investirá o equivalente a 140 milhões de dólares (cerca de um bilhão de reais) em ações de garantia de direitos para a população de rua brasileira. A proposta foi apresentada aos países-membros do G20 e tem como foco que essas pessoas vivam com dignidade e contempla medidas de assistência social; segurança alimentar; combate á violência institucional; promoção da saúde, cidadania, educação e cultura; habitação, trabalho e renda; e produção de dados estatísticos.
“Estar em situação de rua é não ter condições de cuidar da sua saúde, da higiene pessoal de maneira adequada, não ter uma alimentação adequada. A gente precisa atacar o problema. Não significa colocar as pessoas para viver na rua em condição de dignidade, mas construir as portas de saída. O programa procura unir todos esses aspectos que buscam criar saídas para que as pessoas deixem a situação de rua e possam ter moradia como centro, ter uma vida digna”, pontuou Silvio Almeida.